O que cria a realidade: o ato de medir ou o ato psíquico?
Uma reflexão científica e filosófica do Universo
A física quântica é a física das possibilidades! O físico sempre teve a intenção de conceber o que é o Universo físico? Lançou seus “olhos” para as “coisas” que formam o Universo e desde a época de Tales de Mileto (624-546 a.C.), um dos grandes pensadores gregos antigos, que foi o primeiro a tentar encontrar explicações racionais e naturais através de perguntas como: Qual é a matéria-prima básica do cosmos? Já, naquela época, a visão de inquietação frente a explicações mágicas de eventos naturais fez Tales de Mileto inferir que essa matéria-prima deveria ser algo a partir do qual tudo pudesse ser formado, que fosse essencial a vida e tivesse a capacidade de movimento e mudança. Concluiu que a matéria-prima do cosmos era a água. Tudo era composto por água. Bom, após séculos e séculos depois de Tales de Mileto, como poderíamos conceber o Universo? Seria muito bom poder dizer que o universo físico é simplesmente o mundo concebido por um físico, mas ocorre que a concepção que o físico tem do mundo está longe de ser clara. A física, sem dúvida, passou por um desenvolvimento assombroso e ainda continua a avançar. Porém há pouco acordo entre os físicos quanto ao que é, exatamente, que a física traz a luz. Como se pode, assim, falar do “mundo como concebido por um físico”?
A física possui uma metodologia própria, um certo modo de investigação que a distingue. Teorias físicas podem ser suplantadas e opiniões filosóficas podem entrar ou sair de moda, mas há algo que parece ser invariável: os meios cognitivos pelas quais se determina os objetos de modo universal. Esse é o ponto crucial. Digamos que o universo físico seja aquele onde está o “âmbito das coisas” que são cognoscíveis. Onde será que esse raciocínio ontológico vai nos levar? Acompanhem-me, por gentileza. Sei que abordarei aspectos complexos, mas tenho plena convicção que meus leitores conseguirão acompanhar-me. No final, haverá uma perfeita possibilidade de integração entre ciência e espiritualidade. Antes de prosseguirmos, faz-se necessária uma explicação importante que precisamos colocar desde o início. Precisamos diferenciar mundo corpóreo e mundo físico. O universo corpóreo existe “para nós” como um domínio manifesto das coisas a serem conhecidas através da percepção sensitiva. No universo corpóreo estão os objetos corpóreos (pensem em uma bola de bilhar, por exemplo). O universo físico, por outro lado, nós o conhecemos através da medição (modus operandi) feita por um artefato instrumental e não através da visão direta. Através da instrumentação adequada mede-se o peso, o diâmetro, o momento magnético do elétron, a densidade e etc, etc, etc, O mundo físico é o mundo das quantidades e da estrutura matemática, por assim dizer. A metodologia científica (modus operandi), descobre, dessa maneira, o objeto físico. Temos então, de forma resumida, o objeto corpóreo especificado pela percepção sensitiva e o objeto físico especificado pela medição de instrumentos adequados. Qual é o mais real? Objeto corpóreo ou objeto físico? Mundo corpóreo ou mundo físico? Universo corpóreo ou Universo físico?
Temos então um perfeita distinção entre objeto corpóreo e objeto físico. Objeto corpóreo, por ser perceptível, necessita de uma representação mental. O objeto físico, por ser não perceptível, necessita de uma representação teórica. O objeto físico “se mostra a vista” por meio da medição. Só a medição, porém, não basta. Há um aspecto teórico nesse processo cognitivo. Nada que pertença ao domínio físico pode ser conhecido sem uma teoria, sem um modelo apropriado, sem uma representação. Portanto, Experimento e teoria formam um todo inseparável, isto é, formam um único empreendimento cognitivo. Em qualquer experimento que envolve sua medida, a intenção do experimentador e a medição em si é um ato único e inseparável. Os dois tipos de conteúdo ou significado – intencional e operacional – estão intimamente ligados, pois, um objeto físico pode ser modelado ou representado precisamente em virtude da forma como ele se presta a observações empíricas. Um campo eletromagnético, por exemplo, é indubitavelmente mais que o conjunto de leituras dos instrumentos, e um elétron é mais que um arranjo de traços numa câmara de bolhas (local onde é visualizado os “rastros” dos elétrons). As leituras dos instrumentos e os “rastros” em câmaras de condensação apontam para além delas mesmas e esta é exatamente a razão, na verdade, dessas leituras e visualizações serem de interesse para o físico. Descobrir esses componentes invisíveis em uma realidade oculta que se manifesta, ao menos parcialmente, em todo tipo de efeitos mensuráveis. O Universo dos objetos físicos (átomos, campos eletromagnéticos, partículas elementares, momento elétrico, ondas de possibilidades, ondas de matéria e etc) é de certa forma transcendente apesar de ele existir “para nós”.
Nunca ninguém percebeu (percepção sensitiva) um objeto físico. Os “entes” que respondem ao método científico da física são, por sua própria natureza, invisíveis, intangíveis, inaudíveis, assim como destituídos de sabor e aroma. Os objetos físicos são concebidos por meio de modelos matemáticos e observados por meio de instrumentos apropriados. O que realmente percebemos é a bola de bilhar vermelha ou verde. Ninguém, frisando mais uma vez, jamais percebeu um arranjo de partículas subatômicas ou uma coleção de átomos. Há objetos físicos que se apresentam sob a forma de objeto corpóreo. Ou, qualquer objeto corpóreo pode ser submetido a todo tipo de medidas, estabelecendo assim um objeto físico associado. Objeto corpóreo que passaremos a chamar apenas X e o objeto físico chamaremos de SX. Sendo X uma bola de bilhar, por exemplo, podemos medir sua massa, seu raio e uma infinidade de parâmetros físicos e representá-lo como SX. X e SX não são a mesma coisa. São tão diferentes quanto a noite e o dia, pois X é perceptível e SX não é perceptível. Agora vem uma conclusão fantástica. Objeto corpóreo X é a “presentificação” do objeto físico SX. De outra forma, SX torna-se presente em X. O transcendente comunica-se com o manifesto.
Precisamos de mais um conceito. Há objetos físicos tipo genéricos (campo eletromagnético, por exemplo) que só é reconhecido ou “especificado” por um modelo matemático ou representação para sua determinação. Ao contrário, temos objeto corpóreo específico que basta o contato observacional para sua determinação. Quando estamos utilizando atos empíricos (atos de investigação) pelos quais um objeto físico fica especificado chamamos de “especificação”. Como podemos especificar objetos físicos como átomos e partículas elementares? Uma partícula carregada , considerada aqui como um objeto físico SX, deve interagir com um instrumento de medida, que dentro do sistema passa a ser considerado “sub-corpóreo” ,por enquanto, e essa partícula carregada é observada por meio da “presentificação”. Ela tornou-se presente no instrumento de medição. O contador Geiger registra a presença de uma partícula carregada. A partícula penetra na câmara e causa uma descarga elétrica que é, então, registrada de alguma forma ao passar para o nível corpóreo ( na forma de um estalo audível ou pela leitura do contador). Essa cadeia de eventos constitui, evidentemente, uma especificação da partícula. É a única referência que temos da partícula, depois passa ser impossível estabelecer algum contato observacional com ela.
Estejamos lidando com uma partícula fundamental ou com a mais simples entidade sub-corpórea (contador Geiger), não se pode falar de um objeto físico SX antes que se estabeleça um contato observacional inicial. Objetos físicos não crescem em árvores; eles precisam ser “especificados”. Daqui, já podemos inferir a presença de um domínio onde há os “fatos e coisas”, instrumentos que formam esse mundo, aquilo que é real mesmo. Associado, temos o domínio das potencialidades, das possibilidades, das tendências detectadas pela mecânica quântica. São as possibilidades. O que é que faz o mundo das possibilidades tornarem-se realidade em um mundo de fatos e coisas? Inicialmente vamos recorrer a Heisenberg: “Portanto, a transição do “possível” ao “real” ocorre durante o ato da observação. Se quisermos descrever o que ocorre em um evento atômico, deveremos compreender que o termo “ocorre” pode somente ser aplicado a observação e não ao estado de coisas durante duas observações consecutivas.” Como mundo da Potentia de Heisenberg, ou o mundo das possibilidades de SX e agora também da física quântica pode vir ao mundo real? Será que é apenas uma questão de escala? Como se a passagem da potencialidade para a atualidade (realidade) pudesse vir a efeito simplesmente porque se juntou um número suficientemente grande de átomos? Será que o “vir a ser” das potencialidades ao mundo corpóreo ocorreu pelo ato físico da observação, através do contador Geiger, por exemplo? Ou será que o “vir a ser” das potencialidades ao mundo corpóreo ocorreu pelo ato psíquico da obsevação? Como uma onda de possibilidade pode ter um conteúdo “completamente objetivo” se ela depende do resultado de um experimento ser mentalmente “registrado” ou não? Se a posição de um ponteiro, digamos, carrega um estado de coisas objetivas depois de ter sido “lido”, por que não antes? Enquanto não distinguirmos categoricamente entre um sistema físico – por mais macroscópico que seja – e um objeto corpóreo, de fato não haverá saída para esse dilema. Porém a mecânica quântica é bem clara em seu teorema afirmando que sistemas físicos não causam o colapso do vetor de estado (colapso da função de onda). Se supusermos, portanto, que existam sistemas físicos e atos psíquicos – e nada mais – segue-se que o colapso em questão tem que ser causado obrigatoriamente por uma ato psíquico.
Eis o enigma quântico!! O enigma do colapso do vetor de estado (colapso da função de onda) e o enigma corpóreo!! A observação como intermediária. A realidade está em dois domínios: Possibilidades e fato manifesto. Cada tipo de objeto físico é concebido sempre em relação com um procedimento observacional. Objetos físicos não são bem “coisas em si mesmas”; são antes coisas em relação a modos específicos de investigação científica. Sejam as galáxias, sejam campos eletromagnéticos, sejam radiações, sejam átomos, moléculas e partículas elementares. A física lida, não simplesmente com a “natureza” mas com as “nossas relações com a natureza” (Heisenberg). O experimentador “interroga” a natureza, a realidade externa, e ela “responde”. Objetos físicos são “as respostas” que a natureza fornece. A diversidade de objetos físicos – de “respostas” é inspirada pela diversidade de “perguntas” que nós mesmos colocamos. Os objetos físicos existem realmente; o ponto, no entanto, é que esses objetos tem algo de relativo de devem ser encarados, não tanto como múltiplas entidades independentes, mas como manifestações variadas de uma única e indivisa REALIDADE. David Bohm, após o advento e descobertas da física quântica assim se expressou: “ Somos levados a uma noção de totalidade indivisa, a qual nega a ideia clássica de analisibilidade do mundo em partes que existam separa e independentemente”.
Temos uma realidade transcendente que se manifesta parcialmente na forma de objetos físicos. Esses objetos físicos apontam para além deles mesmos. Há um nível mais profundo de realidade. Além do plano físico e do plano corpóreo surge um terceiro substrato. Qual a natureza desse terceiro substrato?
O que significa exatamente essa totalidade indivisa? Como podemos compreender um reino externo que não seja de fato constituído de “partes que existam separada e independentemente”? A realidade está sujeita a uma condição espaço-temporal. Uma natureza que se manifesta no espaço e no tempo. Nas palavras de Henry Stapp: “ Tudo p que sabemos sobre a natureza está de acordo com a ideia de que o processo fundamental da natureza encontra-se fora do espaço- tempo… mas que gera eventos possíveis de serem identificados no espaço-tempo” É isso!! Qual ou quais descobertas apontam para uma realidade indivisa para além do continuum do espaço-tempo? Sem dúvida alguma, o teorema do entrelaçamento de Bell (Não localidade quântica). Dois fotons A e B viajam em direção opostas – a velocidade da luz! – e uma observação efetuada no fóton A parece afetar o fóton B instantaneamente. Como pode isso? Dentro do espaço-tempo Eisnteniano nada é mais veloz que a luz. Essa comunicação ocorre sem troca de energia. Os fótons A e B não são partes que existam separada e independentemente. Elas estão partes separadas e independentes, mesmo porque podemos identificá-las separadas no espaço e no tempo. Os fótons A e B são manifestações de um única realidade subjacente, pois, de fato, onde quer que haja unidade ou uma “totalidade indivisa”, não se vê necessidade para comunicações ou transmissões de efeitos através do espaço e do tempo. Torna-se concebível que uma partícula possa transcender sua localização manifesta e, dessa maneira, transcender igualmente sua identidade fenomênica. Não que a partícula “se projete para outra dimensão”, mas que além do seu aspecto empírico, ela possui uma natureza que de modo algum está sujeita a esse “confinamento”, isto é, ao confinamento do mundo corpóreo.
O que é, então, um objeto físico (Galáxias, campos eletromagnéticos, radiações, átomos e partículas elementares)? Agora estamos preparados para compreender que são manifestações particulares de uma realidade total. Essa realidade total está sempre em dois domínios: Possibilidades e fato manifesto. Objeto físico e objeto corpóreo com suas variedades de gradações. O Ato capaz de colapsar a onda de possibilidade e provocar a especificação, ou melhor, a realidade (trazer do mundo transcendente para o mundo da realidade manifesta) é, sem dúvida, o ato psiquico. É o ato criador em si. A consciência é algo que deve ser valorizado, pois é o que está presente sempre como sujeito e objeto simultaneamente. Daí surgiu a razão desse blog. A consciência é capaz de provocar o colapso da função de onda através do ato psíquico. Com relação a realidade una e indivisa, o objetivo último dos físicos talvez seja procurar por uma lei única, que seja simples (na forma de algum tipo de teoria quântica de campos unificantes) e que descreva corretamente todos os sistemas físicos concebíveis. Atualmente temos as leis de Maxwell que aplica-se a todos os campos eletromagnéticos. Por meio da analogia geométrica, nos tornamos capazes de compreender como a estrutura da natureza – em que pese estar oculta – pode se manifestar nas leis fundamentais da física, nas leis, a saber, que se aplicam sempre em todo lugar aos sistemas físicos aos quais elas se referem. O exemplo do teorema de Pitágoras que se aplica a todos os triângulos retângulos. A física atual ainda não possui um conjunto simples e completo de princípios que cubram o terreno da realidade indivisa e una.
Agora que chegamos a uma realidade fundamental que conecta a todos nós seres sencientes ou não.
Agora que chegamos na compreensão e valorização da consciência criadora da matéria corpórea (dos objetos corpóreos) pelo ato psíquico da observação. Resta-nos descobrir o que fazer com tudo isso? Que tal começarmos pela identificação que somos consciências em evolução que participa de dois domínios de realidade: o mundo corpóreo da manifestação e compartilhamento de experiências e o um mundo onde manteremos a consciência e as possibilidades sutis de escolhas após percorrermos a transitoriedade dentro do espaço-tempo da manifestação dessa realidade indivisa e una. Essa é a razão desse blog. Transformar as pessoas e consequentemente o mundo através dos princípios da física quântica. Ciência e Espiritualidade são facetas de uma mesma moeda.
Em breve continuaremos abordando o assunto e integrando os princípios da física quântica com a espiritualidade. Por ora, basta pelo raciocínio científico filosófico para chegarmos na necessidade do ato psíquico da observação na construção da realidade. Bem, isso nós já sabíamos! A consciência escolhe dentre as possibilidades. É disso que temos falado sempre em nossas conversas. Trazer esses princípios para a biologia recupera o livre-arbítrio. Explica o processamento inconsciente. Compreendemos melhor a relação entre memória e percepção. Estamos nos movendo dentro de um campo fundamental. Estamos todos conectados. É a mais pura verdade. Porém, temos um trabalho longo pela frente, da mesma forma que os cientistas tiveram quando comprovaram que o Sol não girava em torno do Terra. Houve muitas coisas a seres descobertas a partir daí. Agora, não é diferente. Temos muito aprender com a constatação de que há uma realidade una e indivisa que conecta todos nós. A consciência é a base de tudo! Ainda escolhemos sob hábitos e condicionamentos, mas a todo instante podemos dizer não aos hábitos e condicionamentos. É isso!
Abraços fraternos
Dr Milton Moura